amor?
Quando descobri que não conseguiria fugir mais uma vez de estar enfiada numa ambulância em direção a outra cidade, chorei. Em tão pouco tempo, tudo de novo, pra o que prometia ser pior. Chorei por mim e me senti tremendamente egoísta. Eu tava correta quando pensei que seria pior. Em estrutura, em cansaço, em espera. Mas nada me atingiu tanto quando estar mais vulnerável emocionalmente.
A primeira noite foi difícil. Noite inteira andando pelo hospital abarrotado de gente por todo o chão, pessoas feridas em graus diferentes, acalmando minha vó pros mil e um exames que ela foi submetida, em algum momento da madrugada, nos deixaram na curva de um corredor semideserto e dormimos. Ela na maca, eu enrolada no chão, fazendo minha bolsa de travesseiro. A informação que me tinha sido passada nesse momento é a de que teríamos um parecer médico pela manhã. Acordei às 5h e esperei, esperei e esperei. Quase meio dia, entre as várias pessoas que subiram e desceram aquele corredor, ninguém parava pra olhar nem de lado. E aí chorei de novo e novamente por mim. Só conseguia pensar em como mais uma vez tinha sido enfiada numa situação de merda e como tão pouco controle da minha vida eu tenho. A maior parte das pessoas que passavam me ignoravam totalmente e eu seguia chorando sem controle. Um senhor parou perto de mim e disse umas palavras que me assombraram e assombram até hoje: "(...) eu queria que algum dia algum familiar me amasse o quanto você ama sua vó..."
Em nenhum momento do meu choro ou das minhas crises de ansiedade nesse local, amor foi o sentimento que me veio em mente. Raiva, ódio, impotência, medo, sim. Amor, não.
Já em casa, não pior, mas não melhor, lidando com o acelerado estado de demência que se encontra minha vó pós o AVC, eu ainda me vejo questionando que amor é esse. Eu deveria sentir? Eu deveria ter certeza? Eu sinto minha paciência sendo forçada ao limite, eu sinto um cansaço extremo - físico, emocional, mental; eu sinto meu senso de obrigação sendo esticado ao máximo, mas não sei dizer se sinto amor.
Ontem à noite, depois de uma noite extremamente cansativa e repetitiva, chorei mais uma vez e mais uma vez, por mim.